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Requalificação do Trapiche Barnabé reativa Centro Histórico de Salvador

Colaborando com a RAIZ

A reforma do renomado imóvel como espaço cultural na Bahia reforça a necessidade de valorizar melhor o patrimônio arquitetônico do país.

Conhecido como Patrimônio Mundial da Humanidade pela UNESCO, o Centro Histórico de Salvador abriga as raízes culturais, arquitetônicas e o DNA da primeira capital do Brasil. Em meio às fachadas coloniais que compõem a região, a mais recente revitalização do Trapiche Barnabé, edificação do século 18, no bairro do Comércio, sob gestão do cineasta Bernard Attal, deve inspirar uma nova etapa de valorização e recuperação do patrimônio histórico em todo Brasil.

A requalificação do imóvel icônico como espaço cultural na Bahia acompanha o início de um fenômeno nacional de transformação dos patrimônios históricos. Em São Paulo, foi a vez da secular Vila Ferroviária de Paranapiacaba ser reinaugurada em 2025. Em Salvador, a revitalização da rua Chile está em fase avançada. No Rio de Janeiro, o palacete do Parque Lage recebeu sua primeira grande intervenção em cem anos. Já o Memorial do Rio Grande do Sul (RS), afetado pelas enchentes em 2024, passará por uma restauração.

Porém, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), somente em Salvador, lista ao menos, cerca de 2000 imóveis tombados ou em área tombada no aguardo de reformas. Acompanhando o crescente investimento pela esfera pública, o setor privado tem recentemente realizado investidas na reocupação do patrimônio arquitetônico brasileiro. Uma das lideranças desse movimento é o empresário e cineasta Bernard Attal, que antes da reforma do Trapiche Barnabé criou em 2009, na mesma região, o Trapiche Pequeno, hoje, o maior centro de economia criativa do Nordeste.

Trapiche Barnabé - foto Ricardo Prado
Trapiche Barnabé – foto Ricardo Prado

Localizado na área do Comércio, o Trapiche Barnabé integra o ‘Centro Antigo de Salvador’, região com extensão de 7 km². Com uma requalificação cuidadosa e atenta aos detalhes arquitetônicos originais do século 18, o Trapiche Barnabé chama atenção para a necessidade de uma revitalização completa do bairro portuário, com o objetivo de fomentar à cultura e a macroeconomia criativa da redondeza.

Durante o processo de reforma, importantes melhorias foram implementadas para tornar o local mais acessível e funcional, enquanto sua assinatura histórica foi cuidadosamente preservada. A área restaurada possui 1000 m², com elevador, cozinha industrial, camarim, banheiros climatizados, espaços de vários tamanhos para shows, eventos corporativos e cerimoniais, gravações e exposições. Esse trabalho, executado ao longo de dez anos, em respeito ao legado arquitetônico da antiga alfândega, quando Salvador era o ‘Porto do Brasil’, é um reflexo de como as intervenções no patrimônio podem ser realizadas de forma sensível e inovadora.

O Programa da Prefeitura de Salvador de Incentivo à Empreendimentos e Moradias – RENOVA CENTRO, regulamentado no ano passado, é um dos incentivos fiscais para fomentar a moradia, o empreendedorismo e a circulação de pessoas no Centro Histórico até 2034. Na visão do Bernard Attal, radicado no Brasil há vinte anos, é de suma importância pautar o setor público e privado como agentes colaboradores e transformadores do espaço urbano em torno do seu patrimônio arquitetônico.

“Ninguém sabia mais o que era o Trapiche Barnabé até fazermos algo por conta própria, sem nenhum recurso público. Recuperamos um prédio de importância histórica que era completamente abandonado, ignorado e invadido pela vegetação. Isso mostra que a responsabilidade não é só da esfera pública. O setor privado precisa se interessar, mobilizar e agir. O telhado da Igreja e Convento de São Francisco caiu, e depois? O Iphan unicamente destinou R$ 1,3 milhão para obras de caráter emergencial. Na França, para se ter uma ideia, após o incêndio na Catedral de Notre-Dame, há cinco anos, foi captado mais de €1 bilhão de euros em doações privadas para a reforma. Por que no Brasil não conseguimos esse tipo de mobilização? O Brasil possui um patrimônio arquitetônico inegável, não só da época colonial mas também do art-deco, do período eclético, do pós-guerra, que seria objeto de inveja em qualquer outro lugar do mundo. Mas infelizmente, não o preserva e não o explora como deveria”, reflete.

Trapiche Barnabé - foto Ricardo Prado
Trapiche Barnabé – foto Ricardo Prado

Nesse sentido, a experiência do Trapiche Barnabé, com sua reabertura e sua programação cultural diversificada, tem sido um modelo de como o patrimônio histórico pode se transformar em um ponto de atração e dinamismo para a cidade. “As atuações dos Trapiches Barnabé e Pequeno têm contribuído para revitalizar o Centro Histórico em geral e o bairro portuário em particular, trazendo novos visitantes, novas empresas, novos atores, assim movimentando a economia e criando um espaço de convivência vibrante”, complementa Bernard.

O gestor dos Trapiches Barnabé e Pequeno explica que reverter o pessimismo crescente em torno da região e provocar a discussão do combate ao abandono do ‘Centro Antigo’ é uma das prioridades do momento. Para Bernard Attal, o abandono da região se torna ainda mais controverso, já que as riquezas arquitetônicas locais são heranças inscritas na Lista do Patrimônio Mundial e no Livro de Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico, datado de 1984. Bernard acredita que a expansão urbana, a partir dos Anos 60, tenha desencadeado a falta de interesse na área, quando a capital voltou esforços para expandir outras áreas de habitação, em vez de requalificar o Centro Histórico.

“Embora existam leis atuais para reabilitar e revitalizar o Centro Histórico de Salvador, muitas dessas iniciativas atendem apenas, de forma parcial, às necessidades do patrimônio. Estão faltando financiamentos mas principalmente um esforço coletivo da sociedade toda para recuperar o que são consideradas ‘jóias’ do conjunto urbanístico da nossa cidade. No Brasil, há uma tendência de culpar apenas o poder público, mas o setor empresarial e os cidadãos também carregam um papel fundamental de não se omitir. É o que propomos com a requalificação do Trapiche, agora concluída depois de dez anos de um trabalho árduo”.

Trapiche Barnabé - foto Ricardo Prado
Trapiche Barnabé – foto Ricardo Prado

Colaborando com a RAIZ