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Paisagens Mineradas: mostra de arte e resistência em Belo Horizonte

Colaborando com a RAIZ

A exposição fica em cartaz de 5 de julho a 9 de agosto, na Funarte de Minas Gerais – Galpão 5, com entrada gratuita.

Itinerância já impactou mais de 30 mil pessoas em realização do Instituto Camila e Luiz Taliberti, com curadoria de Isadora Canela.

Após passar por São Paulo (SP), Belém (PA) e Ouro Preto (MG), a exposição “Paisagens Mineradas: marcas no corpo-território” chega à capital mineira para propor mais uma reflexão sobre a mineração predatória. A mostra é uma realização do Instituto Camila e Luiz Taliberti, que motivados pelo rompimento da barragem Córrego do Feijão, em Brumadinho, trazem o olhar profundo de 12 artistas mulheres para as consequências da mineração nas paisagens do país e nas vidas dos seus habitantes.

Agora em BH a mostra traz as artistas Beá Meira, Coletivo ASA – Associação de Senhoras Artesãs de Ouro Preto, Isis Medeiros, Julia Pontés, Murapyjawa Assurini (representando o Coletivo Kujÿ Ete Marytykwa’awa), Keyla Sobral, Lis Haddad, Luana Vitra, Mari de Sá, Shirley Krenak, Silvia Noronha e a curadora, que também apresenta uma obra, Isadora Canela. Visando a acessibilidade do público, a mostra conta com equipe educativa e audioguia.

Entre pinturas, gravuras, videoarte, instalações e fotografias, “Paisagens Mineradas” traz à luz a memória dos que perderam a vida e dialoga com um amanhã possível: as obras retratam devastação, mas também a capacidade de regeneração. O texto de apresentação da mostra diz que a mesma é “um convite à imaginação de um solo fértil. Nessa lama vermelho-sangue, semeamos a vida.”

A curadora destaca o papel crucial do feminino na exposição, composta 100% por artistas mulheres, sendo este elemento uma crítica ao apagamento e à exploração delas na história do país: “Em um sistema que normaliza a violência, o que se faz com a montanha, se faz com a mulher. Pensar no lugar que as mulheres ocupam na cultura e na arte, muitas vezes apagadas na história, é uma forma de subverter a lógica de um sistema opressor”, afirma Canela.

foto Isabelle Aguiar - divulgação
foto Isabelle Aguiar – divulgação

Brumadinho não será esquecida

A tragédia de Brumadinho é mais do que uma cicatriz em Minas Gerais: é um marco de luto e luta por justiça. No dia 25 de janeiro de 2019 a barragem de Córrego do Feijão se rompeu, liberando um mar de lama tóxica que ceifou 272 vidas humanas, devastou hectares de Mata Atlântica e poluiu cursos d’água.

Semelhante ao que já havia acontecido em Mariana, MG, em 2015, quando o rompimento de uma barragem tirou 19 vidas humanas, deixou o distrito de Bento Rodrigues soterrado em lama e matou o Rio Doce. Há um intervalo de quatro anos entre um desastre e outro, mas nada mudou e ele se repetiu.

O Instituto Camila e Luiz Taliberti nasceu com o objetivo de ampliar o debate sobre os impactos da mineração e conectar territórios afetados por essa atividade. Em memória dos irmãos Camila e Luiz, que perderam a vida no rompimento da barragem de Brumadinho, o instituto promove ações culturais e de sustentabilidade que alertam a sociedade para os riscos da mineração predatória.

Sobre a iniciativa “Paisagens Mineradas”, Helena declara que, para ela, “é uma exposição sobre perda e renascimento. Uma forma de honrar cada vítima, para manter vivas as suas memórias, e uma forma de buscar justiça por meio da arte”. Ela reforça: “Precisamos mostrar para a sociedade o que aconteceu, para que tragédias como essa não se repitam, para que a vida seja priorizada, e para que a morte deles não tenha sido em vão”.

Pesquisa de público

Uma pesquisa do Departamento de Museologia da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) confirma o impacto positivo da exposição “Paisagens Mineradas” entre os visitantes da mostra em Ouro Preto. “A escuta do público revelou que nossa proposta artística e crítica conseguiu sensibilizar e informar a maior parte das pessoas que passaram pela mostra sobre os impactos da mineração predatória. É um resultado muito satisfatório para o Instituto, saber que estamos conquistando a atenção que esse tema merece”, comenta Helena Taliberti.

Os dados mostram que 57,7% dos entrevistados afirmam que as obras despertaram sua percepção sobre as populações e territórios atingidos pela mineração, enquanto outros 26,9% disseram que a exposição mudou sua compreensão sobre o tema e os ensinou sobre os impactos ambientais e sociais envolvidos. Apenas 3,8% considera que o tema, embora educativo, não condiz com sua realidade, e ninguém discordou da abordagem crítica apresentada pela mostra.

A recepção das obras também foi amplamente positiva: 71,2% dos visitantes consideraram as criações artísticas envolventes e acessíveis, apontando que elas contribuíram para a compreensão do tema. Além disso, 75% dos participantes declaram ter saído da exposição motivados a aprender mais sobre os impactos da mineração, reforçando o papel da arte como ferramenta de conscientização e mobilização social.

Na avaliação geral, a exposição recebeu nota alta do público ouro-pretano: 60% classificaram a experiência como excelente, e outros 35,6% como boa.

As artistas

Beá Meira – Graduada em Arquitetura e Urbanismo pela FAU-USP (1985), investiga paisagens marcadas pela exploração e o antropoceno. Durante três décadas, desenvolveu práticas pedagógicas e colaborativas em arte, além de registrar reflexões visuais em cadernos de desenho. Em 2018, lançou Cadernos da Beá e, em 2021, retomou a pintura e técnicas de gravura, como litogravura e mokolito. Participou de exposições em instituições como o Itaú Cultural, o Museu de Arte do Rio (MAR) e a Lona Galeria de Arte, entre outras.

Coletivo ASA (Associação de Senhoras Artesãs de Ouro Preto) – Fundada em 2008 por um grupo de amigas apaixonadas por arte têxtil, a Associação das Senhoras Artesãs é um espaço de encontro e trocas de experiências, unindo o interesse comum pelo uso criativo de tecidos, agulhas e linhas. Com foco na produção artesanal, o Coletivo ASA busca preservar e promover a identidade cultural por meio de bordados e trabalhos manuais.

Isadora Canela – Artista visual e ativista ambiental brasileira dividida entre Brumadinho e Berlim. Em 2023, cofundou a ONG Webs, que colabora com refugiados, migrantes, mulheres e artistas queer de mais de 10 nacionalidades, culminando na exposição “Fragmentos de Impermanência” durante a Semana dos Refugiados de Berlim. Ela apresentou seu trabalho na conferência sul-africana “(A)Gender Matters” e participou de entrevistas na Croácia e em Munique. Em 2022, começou a cursar disciplina de mestrado em Mudanças Climáticas na UFMG. Também contribuiu com a Exploring Visual Cultures, a “Documenta 15 Summerschool”, e participou da exposição “Body and Self” da Counterpoints. Entre seus trabalhos audiovisuais, se destacam o videoclipe “Leviatã” (2020), sobre fake news, e o filme “À Sombra do Sol” (em desenvolvimento), sobre astronomia indígena.

Isis Medeiros – Fotógrafa com foco em fotojornalismo e fotografia documental, com trabalhos voltados a denunciar negligências de mineradoras em Minas Gerais e violações de direitos humanos. Engajada na luta por empoderamento feminino, realizou o projeto Mulheres Cabulosas da História e recebeu o prêmio Clara Zetkin. Suas fotos foram publicadas em veículos como National Geographic e BBC News. Em 2020, lançou o fotolivro 15:30, sobre o desastre de Mariana, e integra o projeto Testemunha Ocular, destacando-se como uma das principais fotojornalistas do Brasil.

Julia Pontés – Fotógrafa, artista visual e pesquisadora mineira, com foco no impacto socioambiental da mineração no Brasil. Seu trabalho colabora com movimentos sociais e universidades para conscientizar sobre os efeitos do extrativismo. Premiada por instituições como a National Geographic Society e a Universidade de Harvard, Júlia já exibiu obras em diversos países. Professora na Columbia University e Montclair State University, atualmente desenvolve o projeto env-IRON-ment, documentando minas de ferro nos EUA. Também integra o MAM – Movimento pela Soberania Popular na Mineração.

Keyla Sobral – Artista visual, doutora e mestre em Artes pela Universidade Federal do Pará, atua como curadora independente e adjunta da Coleção Amazoniana de Arte da UFPA. Com ampla trajetória expositiva no Brasil e no exterior, participou de eventos como a Bienal das Amazônias (2023) e o Festival ON/OFF, na França (2023). Premiada em iniciativas como o Prêmio Diário Contemporâneo de Fotografia e o Salão Arte Pará, possui obras em acervos como o Museu Casa das Onze Janelas e o Museu de Arte do Rio Grande do Sul. Autora do livro Nunca falei tão sério (2023).

Lis Haddad – Artista multidisciplinar que investiga a relação entre paisagens afetivas e a remodelação do ambiente por forças extrativistas ou exílio. Participou de exposições como a Bienal de Florença (2023) e Over (the) Mine, em Munique (2022). Atuou em residências artísticas na Alemanha e colaborou com a Universidade de Augsburg em projetos sobre coleções etnológicas. Foi aluna convidada da Akademie der Bildenden Künst München e integra o painel da rede Exploring Visual Cultures, com foco em arte, educação e antropologia cultural.

foto Isabelle Aguiar - divulgação
foto Isabelle Aguiar – divulgação

Luana Vitra – Artista cujas obras exploram a relação entre matéria, memória e emoção, evocando poesia e crítica política. Influenciada por sua vivência em um contexto de mineração e marcenaria, sua prática investiga os simbolismos da matéria e suas implicações subjetivas. Trabalha com uma diversidade de materiais, criando objetos e instalações que questionam o cotidiano. Participou da 35ª Bienal de São Paulo e exibiu em instituições como Instituto Inhotim, MAM-Rio, South London Gallery e Framer Framed, em Amsterdã.

Mari de Sá – Artista visual formada pela Faculdade Belas Artes de São Paulo, dedica-se a causas sociais, com ênfase em livros de artista. Suas obras priorizam o uso de matérias-primas locais, promovendo a artesania como uma forma de arte comunitária e estimulando práticas colaborativas que fortalecem o vínculo entre a arte e a sociedade.

Murapyjawa Assurini (representando o Coletivo Kujÿ Ete Marytykwa’awa) – Artista, pintora, ceramista e tecelã, é a filha mais velha de Matuja e Itakyri e mãe de oito filhos. Ela enfrenta o desafio de aprender cada vez mais sobre sua cultura para dar continuidade ao legado ancestral de sua família, seu povo e as futuras gerações. O Coletivo Kujy Ete Marytykwa’awa é uma iniciativa de Mulheres Indígenas Awaete em colaboração com Mulheres Iarakynga, que busca ampliar o diálogo e a troca de saberes entre os povos. O coletivo se conecta em uma rede de cooperação, promovendo a construção social coletiva e a consciência humana por meio da (re)conexão com as terras, águas e florestas.

Shirley Krenak – Ativista e educadora indígena, engajada na luta de seu povo, os Krenak, desde a adolescência. Com uma forte conexão com sua terra, que sofre com a exploração mineradora, ela defende a importância da conscientização ambiental e da educação como ferramentas de transformação social. À frente do Instituto Shirley Djukurnã Krenak, promove o fortalecimento da identidade indígena e valores de coletividade, integrando histórias e saberes tradicionais em espaços educacionais. Shirley acredita no aprendizado contínuo como caminho para a harmonia com a natureza e a cura coletiva.

Silvia Noronha – Artista que vive e trabalha em Berlim. Suas esculturas e instalações utilizam materiais como terra, argila, vidro e resíduos eletrônicos, explorando o conceito de “geologia especulativa”, onde o solo é visto como um meio de armazenar informações temporais. Reconhecida por sua pesquisa, recebeu prêmios como o Neukölln Kunstpreis (2023) e o Elsa Neumann Stipendium (2019). Seu trabalho já foi exibido em instituições renomadas, incluindo a Johannesburg Art Gallery e Kunstquartier Bethanien em Berlim.

Serviço

“Paisagens Mineradas: marcas no corpo-território”
Funarte de Belo Horizonte – Galpão 5

5 de julho a 9 de agosto, de quarta e domingo, das 15h às 20h
Rua Januária, 68 – Centro, Belo Horizonte/MG
Entrada gratuita
Realização: Instituto Camila e Luiz Taliberti
Curadoria: Isadora Canela

foto Isabelle Aguiar - divulgação
foto Isabelle Aguiar – divulgação

Sobre o Instituto Camila e Luiz Taliberti (ICLT)
Entidade sem fins lucrativos, o Instituto Camila e Luiz Taliberti, fundado em julho de 2019 por amigos e familiares de Camila e Luiz para honrar o legado dos irmãos vítimas do rompimento da barragem do Córrego do Feijão, na cidade de Brumadinho (MG), em 25 de janeiro de 2019. O ICLT atua promovendo ações culturais e de sustentabilidade em prol da conscientização sobre as consequências da mineração para as comunidades, além de fazer vasta reflexão sobre o futuro da nossa sociedade, a sua relação com o meio ambiente e o cuidado com os mais vulneráveis. Entre os projetos recentes estão a Mostra de Cinema, Mineração e Meio Ambiente (2023 e 2024) e a exposição Paisagens Mineradas (2024).
Saiba mais em somossementes.org.br.

Sobre a Funarte
Criada em 1975, a Fundação Nacional de Artes é o órgão do Governo Federal brasileiro cuja missão é promover e incentivar a produção, a prática, o desenvolvimento e a difusão das artes no país. É responsável pelas políticas públicas federais de estímulo à atividade produtiva artística brasileiras; e atua para que a população possa cada vez mais usufruir das artes. Atualmente, a Funarte, vinculada ao Ministério da Cultura (MinC), alcança as áreas de circo, dança e teatro; de música, de concerto, popular e de bandas; de artes visuais; e também a preservação da memória das artes e a pesquisa na esfera artística. O trabalho de mais de 40 anos da Fundação inspirou a criação de dezenas de entidades municipais e estaduais assemelhadas, em todo o território nacional.
Saiba mais em www.gov.br/funarte.

Colaborando com a RAIZ